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PEC das Domésticas: avanço civilizatório contra a mentalidade colonial

Por Ivan Valente

Hoje deve ser promulgado pelo Senado Federal um grande avanço civilizatório para o Brasil. A Proposta de Emenda Constitucional 478/10, conhecida como PEC das Domésticas, aprovada no último dia 26 de março por unanimidade pelos parlamentares. É uma iniciativa que demorou décadas para acontecer. Dizemos agora que os direitos das trabalhadoras e dos trabalhadores domésticos foram ampliados mas, precisamente, devemos dizer que estamos agora equiparando os direitos destes profissionais aos demais trabalhadores brasileiros.
O artigo 7º da Constituição Federal de 1988, ao prescrever 34 garantias aos trabalhadores urbanos e rurais, ressalva que os funcionários domésticos têm assegurados somente nove daqueles direitos, além da integração à previdência social. A proposta atual agora estende aos domésticos os mesmos direitos dos outros trabalhadores, como carga de trabalho de 44 horas semanais, sendo no máximo oito horas por dia, o pagamento de hora extra, o Fundo de Garantia do Tempo de Serviço (FGTS) obrigatório (hoje é facultativo), e multa de 40% para demissão sem justa causa.

O Brasil dispunha de uma classe de subempregados, praticamente em situação de servidão. São 7,2 milhões de pessoas que trabalham como cozinheiros, governantas, babás, lavadeiras, faxineiros, vigias, motoristas, jardineiros, acompanhantes de idosos e caseiros. Quase 95% são mulheres, que trabalham sem jornada de trabalho regularizada e ganham menos da metade da média dos salários dos trabalhadores em geral.

Trata-se de por fim, com bastante atraso, a um grande anacronismo da sociedade brasileira. É difícil tentar compreender como é possível que no século XXI ainda seja admissível o tipo de relação trabalhista estabelecida entre patrões e empregados domésticos. Como é possível que um trabalhador ou uma trabalhadora não possam voltar para suas casas depois de um expediente exaustivo. Não é possível conceber que eles tenham que ficar disponíveis integralmente e nem mesmo hora extra recebam de seus patrões. Que possam ser arbitrariamente demitidos, eventualmente por algum capricho, e não recebam uma indenização por isso.

Felizmente, este tempo está para findar. Pelo menos no papel e na garantia de direitos, podemos afirmar que também que uma mentalidade escravista e colonial esteja também chegando ao seu fim. Vemos agora muitos ideólogos do atraso e do conservadorismo, sinhazinhas contemporâneas travestidas de colunistas de jornal, alarmados com o fim do privilégio de que dispunham, da possibilidade de transformar o tempo que perderiam cuidando de seus filhos ou de sua casa. A conveniência de fazer do tempo economizado na manutenção da casa e transformá-lo em horas de trabalho não será mais possível. É evidente que o que o patrão ganha em uma hora de seu trabalho não corresponde ao que ele paga para a sua empregada. Essa exploração tão absurda não será mais possível.

As notícias que têm circulado sobre uma suposta onda de demissões no setor por conta da maior incidência de encargos não devem ser levadas ao limite do terrorismo que alguns tentam impor. Esta é uma prática comum no Brasil diante de avanços civilizatórios que acabam com privilégios seculares. Analogamente, o fim da escravidão suscitou as vozes do “bom senso”, que pouco conseguiam disfarçar seus interesses mesquinhos. É provável que aqueles que se utilizam dos serviços domésticos não deixem de utilizá-lo, e que paguem a justa remuneração por ele.

Muito obrigado.

Ivan Valente
Deputado Federal PSOL/SP