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Livro aborda propriedade sobre águas

Fonte: O Liberal

TERRITÓRIOS

Edmilson Rodrigues apresenta tese de doutorado sobre apropriação privada

Arquiteto e professor pesquisador, Edmilson Rodrigues, lançará hoje o livro Território e Soberania na Globalização – Amazônia, Jardim de Águas Sedento. O livro é baseado em sua tese de doutorado, defendida em 2010, e publicado pela Editora Fórum, de Belo Horizonte (MG), no ano passado.

A obra será apresentada aos leitores paraenses, em pré-lançamento, a partir das 18 horas, na Fox Vídeo, que fica na travessa Dr. Moraes, 584. No dia 4 de maio, o trabalho será lançado na XVII Feira Pan-Amazônica do Livro, no estande de Escritores Paraenses, no Hangar – Centro de Convenções e Feiras da Amazônia.

Doutor em Geografia Humana pela Universidade de São Paulo (USP), Edmilson Rodrigues, que também é deputado estadual pelo Partido Socialismo e Liberdade (PSOL), analisa nas 569 páginas do livro a relação entre globalização e soberania territorial. De forma profunda, o autor lança seu olhar científico sobre o fenômeno da apropriação privada dos recursos hídricos do território na Amazônia, região fundamental para a manutenção do planeta. Os pontos mais importantes da análise do autor podem ser conferidos na entrevista a seguir:

Do que trata o seu novo livro?

Analiso, no atual período histórico da globalização, a soberania territorial, tomando como base o uso do território através de eventos já realizados ou em realização, que são significativos para a interpretação dos constrangimentos que impactam a soberania territorial no processo de reconfiguração e refuncionalização do território. Para isso, analisei o fenômeno da apropriação privada dos recursos hídricos do território, em especial os eventos sucedidos na Amazônia, nosso jardim de águas, destacando os usos territoriais não-hegemônicos, que se constituem em formas de resistência dos lugares.

Que eventos mereceram destaque em sua análise?

Entre outros eventos expressivos a usina hidrelétrica de Belo Monte, pela grandiosidade desse sistema de engenharia e seu potencial no processo de reconfiguração espacial, pois a instalação de sistemas técnicos – verdadeiras próteses – no território, não aconteceria sem um conjunto de agentes normativos baseados em uma geopolítica que expressa os interesses de países ricos, de corporações oligopolistas, das classes hegemônicas, sobretudo os agentes do capital financeiro.

Que agentes são esses?

Destaco as gigantescas corporações que atuam com a exploração dos recursos hídricos (sistemas de abastecimento de água, hidrelétricas etc.) que são representados por uma espécie de “santíssima trindade” financeira da globalização: o Banco Mundial (BIRD), o Fundo Monetário Internacional (FMI) e a Organização Mundial do Comércio (OMC).

Qual o papel dessa “santíssima trindade financeira da globalização”?

Essas instituições multilaterais da ONU exercem de forma articulada papel fundamental na normatização do território a fim de torná-lo dócil ao uso mercantil de seus recursos, constrangendo, assim, a soberania. Essa tríade, composta por agências das Nações Unidas, ganha facilidades do Estado brasileiro no relacionamento com os governos dos Estados territoriais, garantindo, entre outras coisas, a aprovação de dispositivos normativos legais constitucionais ou infraconstitucionais conforme a sua conveniência.

Então, se pode falar que o princípio da soberania do estado territorial está superado?

Não, ao contrário. Apesar dos que se julgam portadores do “pensamento único” defenderem a tese do fim da soberania, esta permanece existindo, pois os eventos exogenamente planejados necessitam do estado nacional para tornarem-se normas nos territórios. A globalização, portanto, não eliminou o sentido de permanência do direito dos povos à autodeterminação e à soberania territorial. Ao contrário, a fragmentação imanente ao processo de globalização reacende a ideia de fronteiras e de estados territoriais.

Mas a globalização não torna mínimo o papel do estado?

Mostro que é uma ideologia a tese da “desterritorialização” dos estados, que não mais teriam a função de exercício do poder soberano. Ora, para além da ideologia, o território usado é uma totalidade dinâmica e contraditória, disputado por todos (instituições, trabalhadores, empresários) e é, também, todo o espaço. É o que Milton Santos conceitua como “espaço banal”, pois na globalização atual são as normas definidas pelas empresas que determinam os usos predominantes no território, visando o lucro. Contudo, há usos populares do território, movidos pela necessidade de bem-estar, que baseiam-se em racionalidades alternativas à do capital. Por isso, destaco a crise dessa ideologia, já que são notórias as resistências indicativas de que uma outra globalização é possível e já vem sendo constituída pelos que querem o território como abrigo, como bem social, sobretudo a água que é, por definição, uma não-mercadoria.

De que modo a privatização dos recursos hídricos assume importância estratégica para esses agentes no período da globalização?

Provei que as resoluções da Conferência de Dublin realizada pela ONU em 1992, ao definir a água como “bem econômico”, logo “precificável”, a fim de ser vendido como qualquer bem mercantil, serviram para orientar o trabalho de normatização do território a fim de tornar legítima internamente essa estratégia dos países ricos e suas gigantes corporações. A partir daí, os governos, domados por essa ideologia, passam, em nome da modernização do país, a protagonizar reformas normativas legitimadoras da entrega ao “livre mercado” de nossos recursos hídricos.